Manaus e Região
TRT-11 realiza evento sobre TDAH com foco em diagnóstico, tratamento e políticas públicas em Manaus

Especialistas compartilharam perspectivas relevantes sobre os desafios enfrentados por pessoas com TDAH em iniciativa realizada no Fórum Trabalhista de Manaus
“Quem convive com o TDAH aprende a traçar suas próprias rotas, respeitar seus ritmos e transformar dificuldades em criatividade e reinvenção. Iluminar esse conhecimento não é expor uma falha, mas redescobrir uma forma rara de estar no mundo”, exemplificou o psiquiatra do Heider Cesar, especialista em transtornos mentais, durante o seminário “TDAH, do reconhecimento aos cuidados”, realizado no Fórum Trabalhista de Manaus (FTM) neste mês, como parte da Semana Nacional de Conscientização sobre o Transtorno de Déficit de Atenção com Hiperatividade (TDAH).
Durante o seminário realizado no Tribunal Regional do Trabalho da 11ª Região (AM/RR) e organizado pela Coordenadoria de Saúde (Codsau), especialistas e educadores trouxeram à tona reflexões essenciais sobre os desafios enfrentados por pessoas com TDAH, com destaque para relatos pessoais, experiências escolares, embates legislativos e a importância das políticas públicas. Com estimativas que apontam entre 5% e 8% da população mundial afetada pelo transtorno, o encontro reforçou como o acolhimento e a difusão do conhecimento são ferramentas fundamentais para transformar realidades.
Para compreender melhor o Transtorno de Déficit de Atenção com Hiperatividade, profissionais da saúde indicam que ele se manifesta por meio de dificuldades de concentração, agitação e impulsividade. O transtorno é classificado em três tipos principais: desatento, hiperativo/impulsivo e combinado. O diagnóstico é clínico e costuma ser realizado na infância por especialistas, com base em critérios comportamentais. O tratamento geralmente envolve o uso de medicamentos, acompanhamento psicoterapêutico e suporte educacional, sempre adaptado às necessidades específicas de cada indivíduo.
A pedagoga Raquel Cleto e a psicóloga Lidinalva Balbi integram o Centro Municipal de Atendimento Socioeducativo e Psicossocial (CEMASP), vinculado à Secretaria Municipal de Educação de Manaus (Semed), onde desenvolvem o projeto Espaço de Superação, voltado ao atendimento de estudantes com diagnóstico de TDAH. Atuando diretamente com crianças que apresentam o transtorno, em parceria com associações locais, ambas participaram de um evento promovido pelo TRT–11, dedicado à temática.
Para Raquel, iniciativas como essa são fundamentais para aperfeiçoar o trabalho realizado com crianças diagnosticadas com TDAH. “O aprendizado precisa ser contínuo. É impossível oferecer um serviço de excelência sem constante atualização”, ressalta. Lidinalva Balbi destaca a importância de ampliar o debate sobre o transtorno, reforçando que o TDAH ainda recebe pouca atenção nas políticas públicas e nos espaços educacionais. “O autismo é amplamente discutido e atendido por diversos serviços. O TDAH, por outro lado, segue marginalizado. Falar sobre o tema é reconhecer que esse público existe, precisa ser acolhido e ter seus direitos garantidos”, pontua.
Diagnósticos e tratamentos
O psiquiatra Heider Cesar, da Codsau do TRT-11, explicou como são feitos os diagnósticos e quais os tratamentos mais comuns para pessoas com Transtorno de Déficit de Atenção com Hiperatividade. Segundo ele, dados globais indicam que de cinco a oito pessoas, a cada 100, recebem esse diagnóstico. Além disso, os meninos são diagnosticados com mais frequência do que as meninas, “mas há evidências de subdiagnóstico entre o público feminino, geralmente por fatores socioculturais e pela manifestação mais sutil dos sintomas, que muitas vezes passam despercebidos ou são confundidos com traços de personalidade”.
Heider ressalta que o TDAH é um transtorno multifatorial, com predisposição genética e influências ambientais e epigenéticas, como dificuldades escolares, baixa autoestima e problemas de socialização. Os fatores epigenéticos são influências externas, como estresse, alimentação, sono irregular ou ambiente familiar instável, que podem interferir no funcionamento do cérebro ao longo do tempo. “É comum que a criança com TDAH esteja constantemente distraída, mesmo durante atividades prazerosas, o que pode gerar um ciclo de frustração e rejeição social”, explica o especialista. Ele acrescenta que essas crianças costumam perder o foco com facilidade, iniciam uma tarefa e logo se desviam diante de qualquer estímulo, o que pode provocar desorganização na rotina escolar e conflitos no ambiente doméstico.
De acordo com o psiquiatra Heider, o tratamento do TDAH exige uma abordagem integrada e personalizada. Ele recomenda atenção especial a mudanças no estilo de vida, como alimentação equilibrada, evitando o consumo excessivo de estimulantes como cafeína e refrigerantes do tipo cola, especialmente entre pessoas mais impulsivas, além de cuidados com a qualidade do sono, prática regular de atividades físicas e técnicas de atenção plena (mindfulness), que auxiliam na autorregulação emocional. Embora o uso de medicação não seja obrigatório, o especialista ressalta que pode ser altamente eficaz quando bem indicada, especialmente em casos que envolvem comorbidades como ansiedade, depressão ou dificuldades de aprendizagem. Segundo ele, a prescrição é feita conforme a demanda individual e pode ser ajustada de acordo com o contexto.
Transtorno, funcionamento e impactos
O psicólogo Arthur César explica que o TDAH afeta o comportamento, o pensamento e a rotina das pessoas, sendo fruto de alterações anatômicas e funcionais no cérebro, além de fatores genéticos e ambientais. “Trata-se de um cérebro diferente, com modos próprios de processar e reagir às situações”, afirma. Mesmo sabendo o que precisa ser feito, o indivíduo nem sempre consegue agir, o que gera frustração e sensação de impotência. Ele aponta que o TDAH compromete áreas como atenção, impulsividade, organização, percepção do tempo e regulação emocional, especialmente diante das exigências modernas, que cobram foco, planejamento e paciência.
Arthur destaca que essas dificuldades podem causar prejuízos escolares, emocionais e profissionais ao longo da vida, contribuindo para baixa autoestima e aumento do risco de comorbidades como ansiedade e depressão. Para ele, o tratamento deve ir além da medicação, incorporando abordagens eficazes como a Terapia Cognitivo-Comportamental (TCC). “A ideia central é mostrar que o TDAH é real, acontece no cérebro, afeta a rotina, mas pode ser enfrentado com conhecimento e apoio”, enfatiza o psicólogo.
Políticas públicas, direitos e serviços de assistência
Já a pedagoga Denise Teperine Dias Barroso, especialista em autismo, TDAH, família e sociedade, também diagnosticada com TDAH, compartilhou uma fala comovente e crítica sobre os desafios enfrentados por pessoas com o transtorno. Desde a infância, percebia comportamentos divergentes e dificuldades escolares, mas encontrou na superação a força para ir além das expectativas. Ao longo de sua trajetória, destacou a relevância da arte, da cultura e dos esportes como formas de enfrentamento e desenvolvimento, sobretudo em uma sociedade que ainda rotula e marginaliza quem é diferente.
Denise fez críticas ao sistema educacional e às limitações das políticas públicas voltadas ao TDAH, apontando que a falta de estrutura e atendimento especializado leva muitos pais a buscar o diagnóstico de autismo como alternativa para garantir acesso a serviços e adaptações escolares. Segundo ela, esse movimento tem gerado uma onda de judicializações e provocado confusão entre os profissionais da saúde. “Há uma busca por diagnósticos prontos, e muitos médicos ficam desconcertados”, comentou. Ela também ressaltou que o TDAH afeta áreas fundamentais como organização, controle emocional e autodisciplina, e defendeu a implantação de adaptações simples no ambiente escolar e laboral, como apoio na gestão do tempo, que, quando naturalizadas, podem beneficiar a todos. Denise reforçou que, com suporte adequado nas escolas, muitos pais não sentiriam necessidade de recorrer a
+++++++
Texto: Jonathan Ferreira
Fotos: Renard Batista
